Da contravenção para o bem da comunidade

Publicação: domingo, 26 de abril de 2009 – jornal Diário Popular

As mais de 300 máquinas caça-níqueis que lotam delegacias e depósitos judiciais de Pelotas podem virar computadores para o serviço público

Elas enchem depósitos judiciais e atravancam delegacias de polícia. Só em Pelotas, estima-se que pelo menos 300 máquinas caça-níqueis estejam em poder do judiciário, e ao invés de serem destruídas, destino mais comum quando os processos nos quais são prova são concluídos, os objetos originalmente projetados para a contravenção podem virar computadores a serem doados a instituições carentes, escolas e até mesmo à administração pública.

A pedido do Diário Popular, o Pró-Reitor Adjunto de Extensão do Instituto Federal Sul-rio-grandense, Miguel Baneiro, e o professor do curso de Eletrônica, Rafael Galli, visitaram a 2ª Delegacia de Polícia Civil de Pelotas (2ª DP) e, ao ver os componentes dos caça-níqueis lá depositados, confirmaram a viabilidade de sua transformação. “O equipamento que tem aí é muito melhor que muitos que temos”, comenta Galli. Paças básicas como monitores LCD, processadores, placas de som e vídeo, fonte de alimentação, pentes de memória e, em alguns casos, nobreaks compõem os aparelhos de jogos. Com o acréscimo de um disco rígido (HD), para o armazenamento de dados, e periféricos como teclado e mouse, computadores totalmente desvinculados de sua origem poderiam ser confeccionados.

Os custos de um projeto como esse, se feito a partir de parcerias, poderia ser mínimo, afirma Baneiro. Para ele, a participação de Ministério Público, iniciativa privada e a comunidade, com a doação do material complementar que geralmente é descartado quando substituído em empresas ou até em casa, viabilizaria a iniciativa. E se inspira em outros projetos do IF-Sul, que utilizaram materiais que virariam sucata e acabaram premiados, como o carro elétrico desenvolvido por alunos.

Ver as máquinas terem um destino diferente do lixo seria uma inquietação à menos para o chefe da investigação da 2ª DP, José Portela. “Isso poderia ser revertido para sociedade de outra forma, o mal fazendo o bem. Só não posso admitir que isso vai virar em nada”, comenta ao lembrar as diversas máquinas que viu terem seus componentes inutilizados pela ação do tempo ou pela destruição determinada judicialmente.

Para ele, utilizar a mão de obra de jovens apenados ou em situação de risco para a montagem dos PCs seria o ideal, já que os capacitaria para o mercado de trabalho. “As pessoas dos órgãos competentes tem que conversar para resolver esse problema.”

Entretanto, a 2ª promotora de Justiça criminal, Maria Fernanda Pitrez, responsável por toda a operação em torno dos caça-níqueis na cidade, não quis dar entrevista ou se pronunciar por meio de sua assessoria de imprensa sobre o assunto.

Projeto Alquimia

A ideia não é nova; cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina e de outros cinco Estados já têm projetos de inclusão digital que beneficiam tanto os aprendizes que fazem a montagem dos computadores com as peças das máquinas de azar quanto aqueles que recebem os equipamentos.

Em Porto Alegre, o Projeto Alquimia, nascido de uma parceria entre o Ministério Público e o Centro Social Marista, monta os computadores a partir das peças que podem ser aproveitadas e de outros equipamentos de informática que seriam descartados. A madeira segue para uma divisão de marcenaria, e na mão dos aprendizes vira móveis e material para artesanato. Os demais custos do projeto são cobertos pelos valores apreendidos dentro das máquinas.

Fazer o reaproveitamento do material beneficia também o ambiente. Metais pesados presente nos componentes, como mercúrio, cádmio, chumbo e cromo, se tornam uma fonte de contaminação de água e solo com a destruição e descarte no lixo comum.

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